O Rio de Janeiro da primeira década do século XX apresentava-se como uma capital de aparentes contradições. A reforma empreendida pelo prefeito, do então Distrito Federal, Francisco Pereira Passos, visava eliminar, sobretudo, as contradições do espaço urbano carioca. Era preciso a cidade assumir feições novas, de acordo com as determinações econômicas e ideológicas do momento.
O Rio de Janeiro tinha que se tornar uma nova capital, espaço do moderno, da civilização, que simbolizasse realmente a importância do Brasil, e fosse expressão dos valores e modos de vida cosmopolita e moderna da elite do país. Dentro desse quadro havia uma tensão entre a civilização e o atraso. “Era preciso acabar com a noção de que o Rio era sinônimo de febre amarela e de condições anti-higiênicas; transformá-lo num verdadeiro símbolo do ‘novo Brasil” (Abreu, 1997). A cidade tinha a função de servir de exemplo para todo país. Tinha que estabelecer a sua vocação moderna, conforme as grandes capitais européias.
Pereira Passos, apoiado por Rodrigo Alves e os setores dominantes da sociedade, estabelece seu plano e dando início ao “bota-abaixo”, começa a realizar as obras de embelezamento e saneamento da cidade.
Com as obras de demolição, vários prédios que serviam de moradia às populações pobres, foram destruídas. De fato com o alargamento das ruas centrais e a inauguração de novas vias de comunicação, ocorreu a destruição de inúmeros cortiços, que eram entendidos como sínteses da insalubridade e da violência, espaço da barbárie. A reorganização do espaço urbano carioca, sob novas orientações econômicas e ideológicas, não condizia com a presença de pobres na área central da cidade. Afastar os pobres da área central da cidade e não permiti-los entrar nas áreas nobres são objetivos de todos os prefeitos até Pereira Passos. A cidade com a reforma define quem deve ou não deve estar na área central.
A população pobre que morava nas propriedades coletivas se via forçadas a morar, grande parte, com outras famílias, a pagar aluguéis altos, ou ir morar nos subúrbios, já que eram poucas as moradias populares feitas pelo governo em substituição às destruídas.
Pereira Passos ao eliminar as contradições do espaço urbano carioca gerava novas contradições. Com a destruição de inúmeros cortiços, a única alternativa, para uma população pobre que precisava morar próximo ao local de trabalho foi à favela. Os morros do centro, até então poucos habitados, passam rapidamente a serem habitados dando origem a algumas atuais comunidades carentes . O escritor Lima Barreto, dá-nos uma descrição da situação desses lugares: “Há casas, casinhas, casebres, barracões, choças, por toda a parte onde possa fincar quatro estacas de pau uni-las por paredes duvidosas (...) Há verdadeiros aldeamentos dessas barracas nos morros (...) Nelas há quase sempre uma bica para todos os habitantes e nenhuma espécie de esgoto” (Barreto, 1997).
No entanto, como disse anteriormente, nem todos que eram expulsos dos cortiços, foram morar na favela. Grande parte da população foi morar na área suburbana da cidade, contribuindo para a ocupação do espaço. O Rio de Janeiro continuou uma cidade de contrastes, onde o novo se misturava com o velho, como por exemplo, ao lado do homem moderno surgiam tipos urbanos ligados à pobreza urbana. Fixou-se assim o cenário, a imagem que se ia caracterizar a aparência do Rio.
Nota:
[1] Sobre a criação das feiras livres na ciadade do Rio de Janeiro ver: http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-194-62.htm
Referências Bibliográficas
ABREU, Maurício de A. Evolução Urbana do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: IPLANRIO, 1997.
RODRIGUES, Antônio Edmílson M. “Cidade e Modernidade”. In: Anais Transdisciplinares: Experimentando a fronteira entre a Psicologia e outras práticas teóricas.Rio de Janeiro: UERJ/ DEPEXT/ NAPE, 2001.
BARRETO, Lima. Clara dos Anjos. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997.